Jeffeson Rueda reassume o comando cozinha e mostra a diversidade do porco de forma delicada e sofisticada

Como pode um menu degustação dedicado ao porco ser tão elegante? É com essa sensação que saímos d’A Casa do Porco, restaurante paulistano que chegou a conquistar o título de 7º melhor do mundo em 2022 e quarto melhor da América Latina em 2023 pela premiação que é o “Oscar” da gastronomia, o “The World’s 50 Best”.

Esse ano o endereço recebeu a Estrela verde MICHELIN, que destaca os restaurantes mais avançados em termos de práticas sustentáveis por conta da criação dos porcos no Sítio Rueda, em São José do Rio Pardo/SP.

Os animais criados são das raças brasileiras Sorocaba, Plau, Canastra, Caruncho e Pereira, que chegam à mesa dos clientes com o máximo de aproveitamento de suas partes.

Em oito etapas (R$ 290 com bebidas à parte), apreciamos quinze preparos que levam a carne de porco nas mais variadas técnicas como terrine, tartar cru, mortadela, à milanesa, linguiça, confitado na banha, caldos, partes servidas em lâminas cruas e maturadas, recheio de empadinha, pinga e frita, assado com a pele vitrificada e até pururuca envolvida por chocolate. O restaurante também oferece opções à la carte. como a pancetta com goiabada, um clássico da casa.

Comece a experiência com uma dose da cachaça Amorosa, reserva do próprio chef Jefferson Rueda, ideal para abrir o apetite e não perca a harmonização com vinhos brasileiros (R$ 210) do sul do Brasil das prestigiadas vinícolas Era dos Ventos, Pizzato, Guatambu, Don Abel, Serra do Sol e as paulistas Goes e Pardinho.

Mortadela “Porco Real”, de fabricação própria com pão de torresmo e manteiga queimada já dá aquela sensação de “UAU” logo no início do menu e te prepara para o espetáculo que está por vir. Junto chegam três delicados snacks para serem comidos com a mão: terrine de joelho de porco com cambuci e maxixe; tartar de porco cru com coalhada e caruru; cuscuz de porco assado com ovo e palmito. Para limpar o paladar, uma folha de ora pro nobis com pó de gengibre e cúrcuma causa boa salivação.

O primeiro vinho da harmonização é o Pizzato Vertigo Nature da Denominação de Origem Vale dos Vinhedos (D.O.V.V.). As uvas Chardonnay e Pinot Noir ficam 30 meses de contato com as borras nesse espumante de método tradicional.

Continuamos a comer com as mãos três salgadinhos: bolinho de porco na lata com mandioca e banana; porco à milanesa no pão de batata doce e beterraba e a espetacular empadinha de linguiça caipira, requeijão de corte e farofinha de cuscuz.

Delirei com o caldo de porco que leva missô e tucupi: puro umami na charmosa canequinha rosa estampada de nariz de porco.

Harmonizou com o Guatambu Estancia Branco de Campanha Gaúcha. O blend Chardonnay, Gewürztraminer e Sauvignon Blanc resultou em um vinho fresco e aromático. Atuante no agronegócio desde 1958, a Estância Guatambu iniciou o plantio de uvas viníferas em 2003. Em 2017 recebeu o Selo Solar, primeira vinícola da América do Sul a colocar no mercado vinhos produzidos 100% com energia renovável.

Hora dos talheres para apreciar pratos em que o suíno aparece com delicadeza. Primeiro um carpaccio de lombo de porco cru maturado temperado com gotas de mostarda fermentada e emulsão de alcaparra e anchova.

Inaugurada em 2005, a vinícola Don Abel possui uma cave subterrânea climatizada para mais de 100 mil garrafas em Casca – RS. O Hectare Chardonnay 2022 passa 6 meses em barricas de carvalho francês e segue para as caves subterrâneas antes de ser comercializado. Com uvas provenientes de Cotiporã, adquiriu complexidade para harmonizar com o porco cru maturado.

Em seguida, um ravióli recheado de codeguim e camarão com caldo de vegetais tostados e espinafre refogado.

Localizada em Urubici/SC, uma das cidades mais frias do Brasil, a Vinícola Serra do Sol foca na produção de uvas italianas. Ribolla Gialla é uma variedade tradicional região de Friuli, cultivada também na Eslovênia, onde é conhecida como Rebula e em áreas da ilha grega Cefalônia, onde é chamada de uva Robola. Resulta em vinhos acidez, estrutura leve e presença de notas cítricas e frutais. O Serra do Sol Ribolla Gialla passa 12 meses em carvalho francês.

 

A sutileza do menu degustação continua com a costelinha refogada entremeada na quirela de milho crioulo e espuma de milho com queijo.

 

“Na minha opinião a Era dos Ventos é das melhores vinícolas do Brasil. O Laranja On The Rock Trebbiano tem uma característica que normalmente não se procura para harmonizar com carne de porco, que é a mineralidade, porém deu certo!”, comemora André.

O enólogo Luís Henrique e Talise Zanini resgata as origens dos primeiros imigrantes italianos na região. É um vinho de fermentação espontânea, sem qualquer aditivo enológico, macerado por 10 dias em lagar de basalto (rocha-mãe da Serra Gaúcha). Cerca de 30% amadurece em barricas de carvalho francês por 10 meses e ao final não é filtrado. Produção de apenas 800 garrafas. Tem bastante frescor, aromas de frutas amarelas, casca de laranja e notas minerais.

A estrela da casa é o Porco Sanzé, em homenagem a São José do Rio Pardo, servido desde a abertura, há quase 10 anos. Depois de desossado, o porco passa por uma marinada de três horas antes de ser assado por seis horas na brasa. Inesquecível como o tutu de feijão, o tartar de banana, a farofa na manteiga e a couve cortada bem fininha que acompanham a estrela. Essa maravilha será preparada ao vivo pelo chef Jeffeson Rueda para apreciação do público durante o Festival Cultura e Gastronomia de Tiradentes no Espaço Brasa e Lenha.

Em 2019 a Pardinho Artesanal foi além da produção de queijos e iniciou sua primeira experiência de vinificação em parceria com produtores franceses. Ganharam reconhecimento internacional com o Custa e Mandala, queijos de leite cru de vacas da raça Gir, criadas soltas na Fazenda Sant’Anna em Pardinho/SP, ordenhadas por estímulo natural, sem artifícios químicos. Seguiram a mesma filosofia na produção de vinhos naturais com as uvas Cabernet Franc e Chardonnay, isentas de insumos enológicos artificiais, provenientes da região basáltica de Campos de Cima da Serra/RS. A vinificação é feita em Colinas/RS com leveduras selvagens, sem filtragem, clarificação e minimamente sulfitado, sob cuidados do enólogo Jean Christophe Comor, proprietário de uma pequena e prestigiada produção de vinhos naturais na Provence – Domaine Terres Promises. “É um Cabernet Franc leve, de acidez moderada e taninos potentes”, comenta o maître André.

“Da teta da vaca” é o nome da sobremesa composta por arroz doce, sorvete de baunilha fresca, espuma de leite, toffee de caramelo, amendoim crocante e pão tostado.

A Vinícola Góes, sediada em São Roque no interior de São Paulo desde 1985, tem suas origens no mundo do vinho desde 1938. Desde 1989 funciona também em Flores da Cunha/RS, em sociedade com a Família Venturini.

O Vinho Licoroso Edição Especial Gumercindo de Góes é um vinho branco fortificado da variedade Lorena, com passagem por 8 anos em barricas de carvalho francês e americano de 4º, 5º e 6º uso. Revela deliciosas especiarias adocicadas, como baunilha e canela.

O café que encerra o menu é de Carmo de Minas/MG, da Tocaya Torradores de Café ao lado de docinhos como a bananada produzidos no próprio Sítio Rueda, casquinha de sorbet de morango, queijo com compota de abóbora e o surpreendente flocos de porco. Que baita show!

Parabéns, Jeffin!

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A Casa do Porco na minha coluna de gastronomia do Cidade Conecta

 

A Casa do Porco

Rua Araújo, 124, República, São Paulo, SP, Brasil

acasadoporco.com.br