Caio Soter é um profundo estudioso da gastronomia, apaixonado pela comida de Minas Gerais e está no auge da sua criatividade. Com o dom da oratória nos conta que “a cozinha mineira nasceu da pobreza. Na época da mineração, quando não tinha ninguém disposto a semear a terra, cultivar o alimento e criar animais, todo mundo só estava preocupado em tirar o ouro da terra e tivemos que viver do quintal. As mulheres precisavam ter um quintal no fundo de casa para alimentarem suas famílias. Daí tiramos várias lições. Aprendemos que as verduras verdes escuras são ótimas fontes de proteína e que dá para conservar um porco o ano inteiro fazendo linguiça, carne de lata, defumados como bacon e calabresa, tudo pode ser aproveitado. A sustentabilidade é natural do mineiro. A vaca atolada, por exemplo, é muito mais mandioca do que costela. Então essa diminuição de consumo de proteína, não é novidade, é uma questão de 300 anos atrás em Minas Gerais. Quando falo que a intenção é ter um cardápio 70% vegetal, não é por um modismo, é por respeito à nossa tradição.”

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Lançado junto com o Pacato, o rum da destilaria Yvy foi apresentado no welcome drink com cordial de milho, gengibre e abacaxi.

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Já no couvert dá para sentir o cuidado na seleção de ingredientes. Para passar no pão quentinho da Cumpanio, vem uma manteiga de porco caruncho feita na casa. Criados em liberdade no Vale do Paraíba, Rafa Bocaina alimenta os porcos com uma ração orgânica a base de 15 grãos, dentre eles gergelim, chia e arrozes especiais como o negro, o integral o mini e o cateto, o que deixa a banha muito aromática e resulta numa manteiga especial.

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A partir desse momento começa o serviço de vinhos selecionados pelo aclamado sommelier Gustavo Giacchero, que vem à mesa e recita cada rótulo. Iniciamos brilhantemente com o Delgado Zuleta Jerez Fino de alto frescor, algo não tão comum nesse estilo.

Os snacks são uma bela homenagem ao reino vegetal em três versões em que o milho, feijão e a couve são transformados na bocada perfeita. São eles a rapa de angu, creme de pipoca e páprica; telha de feijão branco, vinagrete de fradinho, espuma de tutu e pó de feijoada; crocante de couve, vinagrete de talos, mousse de taioba e pó de couve.

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A proteína preferida do chef é o frango e comi preparos espetaculares por lá. A ostra de frango é um corte do dorso próximo à sobrecoxa, muito macio e suculento, mais comum na França, conhecido como sot-l’y-laisse. Servida na concha do molusco marítimo, no Pacato a ostra de frango vem morna, com molho a base de jaboticaba e laranja, patê de fígado e geleia de jiló.
Também para comer sem talheres, e se lambuzar nos sabores, a asinha desossada é recheada de galinhada. Logo em seguida vem um lencinho com lavanda para limpar os dedos.

Essa etapa do frango foi acompanhada por um Torrontés clássico argentino produzido pelo Marcelo Pelleriti, dos melhores enólogos dessa nova geração. Muito elegante, com aromas florais sutis e bela acidez.

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Sopa de pé de porco e legumes tostados é baseada no tradicional preparo francês fromage de tête, o queijo de porco. Trata-se de um cozido com as partes mais colagenosas do porco, a ser derretido pelo comsome de vegetais tostados servido na hora com toque salino da salicornia.

Harmonizou com Pinot Noir chileno de Limari, mais ao norte do Chile, cerca de 4km do oceano Pacífico.

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Sou suspeita para opinar sobre o próximo prato, já que tem três dos ingredientes que mais amo – milho, jiló e quiabo. O jiló é brilhantemente servido em textura firme, envolvido no molho de mel, mostarda L’Ancienne, limão e pimenta caipira que suavizam e equilibram seu amargor. A iguaria repousa sobre um creme de milho e o pó de quiabo cai feito purpurina no prato, dá brilho e sabor.

De volta aos vinhos brancos, a Vizar produz o Verdejo Ecológico, com perfil de tinto em termos de estrutura. Poderia ser chamado de vinho natural já que quase não há intervenção no processo de vinificação. Para mim o melhor vinho da noite, com certa untuosidade que preenche a boca, cultivado às margens do Rio Duero, da D.O. Castilla y León.

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Aqui está a prova de que nem todo peito de frango é seco e sem gosto. Confesso que é um corte que não me desperta tanto interesse e o Caio simplesmente fez o melhor peito que comi na vida. O segredo é que entre a pele e a carne há um fino recheio de fígado de galinha, sobrecoxa e urucum, sem falar na densa glace de pé e pescoço de frango derramada ao lado do purê de cenoura com laranja e gengibre. Perfeito para acompanhar aves, o Festivo é um rose de Malbec, delicado e sutil em contrapartida do que ser espera dessa casta de muita concentração e fruta vermelha.

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A versão de vaca atolada do Caio é transformadora. O formato é de um bolo de rolo feito em finas fitas de mandioca enroladas com carne de costela desfiada. Por cima vai espuma de manteiga de garrafa e agrião fresco e em pó. Genial! Harmonizou com o 100% Tempranillo Re Minor, um vinho simples e extremante bem feito da prestigiada região de Ribera del Duero.

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Nesse momento do menu chega uma charada. A marmelada não é de marmelo e você é convidado a adivinhar qual foi a fruta usada para acompanhar o sorvete de capim limão e a farofinha de pão doce.

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Na tarta de queso basca, foi usado o milho verde e queijo Canastra para dar aquela mineiridade. Para a calda de doce de leite, Caio fermentou o leite antes de fazer o doce para dar uma boa acidez. Acreditem, pimenta do reino e flor de sal ficam excelentes na sobremesa.

O Sagrado Colletions Porto DOC White harmonizou muito bem com as sobremesas, dulçor e acidez em perfeita harmonia.

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Os petit fous completam a valorização da cozinha mineira. Bombom de chocolate amargo com cenoura e flor de sal, broa de fubá com soro de leite e o queijo do Miguel de maturação padrão da Canastra, com seus 22 dias é ideal para um cafezinho ou um chá. A propósito, eu fui no chá de abacaxi, laranja e limão capeta.

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Tivemos um gostinho do menu a la carte com esse milho assado maravilhosamente defumado, servido com molho gribiche, páprica e coentro. São pratos completamente diferentes do menu degustação.

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O menu degustação tem duração aproximada de 1h40 a 2 horas e fica em R$ 280. A harmonização com vinhos deixa a experiência completa por mais R$ 210.

Que noite fantástica! Caio, você arrasou!

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Croquete, Mayra e Ale.

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A cara de quem ama comer bem!

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Pacato na minha coluna de gastronomia do Cidade Conecta.

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Pacato

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