Texturas e combinações inusitadas surpreendem o paladar e nos instiga a sair do óbvio ao degustar cada etapa.

Dessa vez o chef Yves Saliba não se ateve a um tema específico para criar seu novo menu. Os nove tempos abordam diferentes conceitos, que passeiam pela gastronomia internacional sem deixar de lado elementos da nossa terra.

Os vinhos escolhidos pelo sommelier Fred Langbehn para essa harmonização são todos brasileiros e muitos deles mineiros como o Primeira Estrada Sauvignon Blanc 2021 da vinícola Estrada Real, pioneira na Serra da Mantiqueira. Brilhou também com o espumante Casa Geraldo Brut Colheita de Inverno e o Rococó 2020 da Artesã de produção limitada a 1.300 garrafas.

Para quem opta pelo menu harmonizado há um tempo extra, o tartar de peixe apresentado com recheio do macaron. Dá uma confusão na mente e essa sensação representa bem o que o chef quer causar nos comensais: experiências fora do comum.

A vinícola Casa Geraldo tem uma linha superior de vinhos chamada Colheita de Inverno que tem apresentado ótimos vinhos. Não é tão comum encontrar espumante de Sauvignon Blanc e nesse caso foi feito pelo método Asti, em que ocorre apenas uma fermentação e os aromas da uva são ressaltados. Salsão me veio no nariz com esse espumante, praticamente um pote de temperos, como observou o Croquete.

Tenho acompanhado cada um dos menus criados pelo Yves no Per Lui e a evolução é nítida. Já sinto que a etapa dos snacks é a que mais me conquista e delirei com textura de nuvem do brioche amanteigado com mousse de fígado de galinha, cioba e óleo de alho poró. Tenho um pouco de preconceito com a massa molega do bao, mas a versão do Yves Saliba é crocante e o polvo defumado perfumou a mesa, muito bem combinado com gel de mexerica e a picância do pico de gochujang.

Produzido pelo Murillo de Albuquerque Regina, considerado pai da viticultura do sudeste por ter desenvolvido a técnica de dupla poda, o Primeira Estrada Sauvignon Blanc tem suas uvas plantadas em Três Corações, sendo vivificado em Caldas, na EPAMIG onde foram feitos os primeiros trabalhos de colheita no inverno. Na taça percebemos aromas cítricos, maracujá, um vinho equilibrado e muito agradável.

A mão preta moldada de funcionários da casa segura o delicioso taco de berinjela, besuntada com furikake, cogumelos eryngui, creme de castanha e purê de limão capeta, em uma perfeita mistura de sabores e belíssima apresentação. Harmonizou com Luiz Porto Chardonnay.

No terceiro tempo a cenoura aparece inteira coberta por pó de beterraba, cozida no caldo de frango, levemente tostada e em creme, em sintonia com húmus e semente de girassol picante, na mesma paleta de cores, quebrada pela folha de capuchinha da Orgânicos das Oliveiras.

Saímos de Minas e fomos para o Vale dos Vinhedos com o Terroir Gewurztraminer 2022 da Casa Valduga e suas notas de pera e lichia. A Linha Terroir foi concebida para valorizar potencial de cada varietal, cultivados nas principais regiões vitícolas do Rio Grande do Sul.

Os dois próximos pratos são suaves – palmito pupunha, água de tomate amarelo, camarão laqueado e gotas de óleo de harissa e coentro. A recomendação foi cortar um pedaço do camarão e pupunha e usar a colher para juntar todos os elementos ao levar à boca.

Da cidade de Itaqui, divisa com Argentina, na Campanha Gaúcha, o 3 Bocas Branco leva esse nome por ser produzido com 3 castas Arinto, Alvarinho e Assyrtiko plantadas em 3 altitudes diferentes na vinícola Campos de Cima, de propriedade de 3 mulheres. A três safras desse vinho foram vendidas para Inglaterra e algumas garrafas estão no Per Lui, um vinho floral e delicado com o sabor do prato.

O spaghetti é feito na casa e evolvido por um creme de couve flor levemente defumado com maracujá ao lado, que chega a ter um toque adocicado.

Voltamos à Minas Gerais, São Gonçalo do Sapucaí, onde a vinícola Barbara Heliodora produz um rose de Syrah com presença de Tutti frutti e morango. Lembrei daquela balinhas da infância.

Aí vem a potência da bochecha de porco em baixa temperatura com couve manteiga ao gengibre,

dashi regado na mesa e o contraste de temperatura do gelato de cogumelo salgado, inusitado.

Também em São Gonçalo do Sapucaí está a pequena vinícola Artesã, do casal de engenheiros Luis Toledo e Roberta Cavalcanti que tive a honra de conhecer ano passado na Rex Bibendi. Blend das uvas Cabernet Sauvignon e Cabernet Franc, o Rococó ainda não havia sido lançado, estava sendo envelhecido em barricas de carvalho francês de primeiro uso fabricado com madeiras provenientes de diferentes florestas na França, com dimensões, granulação e intensidade de tostas distintas. Apresentou elegantes notas herbáceas, ótima acidez e equilíbrio.

Não esperava que fosse dar certo um peixe como último prato principal, porém o pirarucu, rei da Amazônia, tem textura firme e foi servido com mollet negro bem picante.

Mais um vinho brasileiro, dessa vez de Bento Gonçalves, na Bodega Iribarrem, da uva Tannat com 18 meses de amadurecimento em barricas de carvalho francês. Um vinho Gran Reserva estruturado com tanino sedoso e elegante, apenas 1.068 garrafas.

Harmonização de peixe com Tannat na verdade se deu pelo mollet negro e sua notas condimentadas, rico em especiarias e nuaces balsâmicas e torradas.

Achei interessantíssima a sobremesa, uma homenagem aos tubérculos em forma de bolo de mandioca, crumble de cenoura e gelato de beterraba com iogurte com especiarias. Harmonizou com o Hidromel Orun Ale, feito com mosto de cerveja Red Ale e vinho Cabernet Sauvignon e sua complexidade de aromas.

Ao final cafezinho com petit four.

 

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Per Lui na minha coluna de gastronomia do Cidade Conecta BH

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Per Lui

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